A vanguarda klaxista
Klaxon é considerada a primeira revista modernista brasileira, produto subsequente da Semana de Arte Moderna de 1922, foi lançada em maio, dois meses após o encerramento do evento. Segundo Guilherme de Almeida, sua publicação não foi planejada com antecedência, teria sido uma consequência necessária para que o espírito da Semana não se perdesse1. A revista foi produzida pelo grupo de intelectuais que capitaneou o movimento de arte moderna no Brasil, atuando como suporte das ideias e criações que haviam sido apresentadas ao público nas sessões do teatro municipal de São Paulo. Foi o espaço no qual o grupo expandiu suas ideias, discutiu e criticou a produção artística da época e publicou fragmentos de sua produção literária.
A edição inaugural traz manifesto que apresenta as intenções da publicação, dividido em quatro partes: “Significação”, “Estética”, “Cartaz” e “Problema”. Em “Significação” rememora-se o início da luta modernista em 1921, travada no Jornal do Commercio e no Correio Paulistano, além da própria Semana de Arte Moderna, e explicita-se que Klaxon veio para refletir, esclarecer e construir a partir dos erros cometidos. Argumenta-se que o Brasil deveria se esforçar para compreender a publicação, demarcando sua posição de vanguarda.
No tópico “Estética” asseverou-se seu caráter atual, internacionalista, com visão transformadora e até deformadora da natureza. Posiciona-se como klaxista e não futurista, o que aponta para o desejo de independência. Nesse tópico, para se posicionar a favor das novas linguagens e tecnologias, compara Pérola White, artista do cinema, com Bernhardt, representante do teatro oitocentista. Sarah estava associada à tragédia, ao romantismo sentimental e técnico, que deveria ser suplantado por Pérola com raciocínio, instrução, esporte, rapidez, alegria, vida, já que o cinema seria a criação artística mais representativa na época.
“Cartaz” aborda a época como o momento da técnica e compara seus colaboradores a engenheiros, que poderiam se utilizar dos materiais que quisessem experimentar e assinar.
Por fim, em “Problema” anuncia o romantismo e o simbolismo como movimentos a serem suplantados por meio de uma construção alegre, já que seria a era do riso, da sinceridade, da construção, enfim, “era de Klaxon”.
Apesar de propor reflexões no manifesto, sua atuação foi combativa e crítica, no intuito de validar as manifestações da arte moderna em detrimento dos movimentos considerados ultrapassados. As produções ficcionais, de crítica literária e artigos enalteciam as novas mídias e tecnologias, como o cinema e o aeroplano, e desdenhavam do parnasianismo e do romantismo, referindo-se aos seus autores como passadistas.
Não há menções sobre a equipe responsável pela publicação, contudo segundo registros de Joaquim Inojosa, Rubens Borba de Moraes foi quem esteve à frente das providências relacionadas às assinaturas, anúncios e colaborações2. Tal empenho explica-se pelo fato de Borba considerar estratégico o fato de o grupo ter em mãos uma revista para dizer o que desejava, divulgar obras experimentais e polemizar com os que não se arriscariam a aderir às novas ideias3. Se ele era peça chave para a articulação dos aspectos práticos da publicação, Mário de Andrade era o protagonista em termos de colaborações, notas, críticas e informes.
Os colaboradores de Klaxon eram chamados na revista de klaxistas, rubrica que denotava a inclusão dos mesmos no rol do modernismo e do internacionalismo pretendidos pela publicação. A busca por tal posicionamento manifesta-se graficamente, pelo conteúdo experimental, pelo uso de diversos idiomas em suas páginas, pela relação com revistas estrangeiras. De todo modo, Klaxon não se posiciona alinhada a nenhuma vanguarda artística, mas deixa clara sua posição contrária ao Futurismo de Marinetti, rebatendo críticas publicadas na imprensa que associavam a proposta de Klaxon ao movimento italiano.
Seu público-alvo era a elite interessada em arte de vanguarda, tanto que mantinha relação amistosa com alguns periódicos estrangeiros, sempre referendados em sua seção “Livros e revistas”, tais como a belga Lumière, a francesa La Nouvelle Revue Française, a inglesa Fanfare, dentre outras. Cabe destacar que havia um intercâmbio de colaborações entre intelectuais das referidas revistas com os klaxistas.
A revista era financiada pelos próprios colaboradores. Não obtiveram sucesso na venda de conteúdo publicitário, tendo sido estampados apenas dois anúncios nas duas primeiras edições. Ademais, o sistema de assinaturas não obteve êxito, pois angariaram apenas um assinante que, a despeito de haver pago a assinatura anual, devolveu o exemplar inaugural, sob o argumento de que não tinha interesse em receber as demais edições, uma vez que o conteúdo escapava à sua compreensão. Apesar de haver renunciado à quantia paga, Guilherme de Almeida conta que o pedido do assinante não foi atendido e ele recebeu todos os exemplares publicados4.
O conjunto de elementos que marcaram a publicação da Klaxon, como colaboradores, conteúdo, configuração gráfica e posicionamento crítico mostram que a revista tinha o intuito de renovar as formulações artísticas da época e constituiu o suporte adequado para veicular com liberdade a produção do grupo modernista.
Letícia Pedruzzi Fonseca
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Guilherme de Almeida, Folha de São Paulo, 1968. Apud Plínio Doyle, História de revistas e jornais literários, vol. 1, Rio de Janeiro, Ministério da Educação e Cultura, Fundação Casa de Rui Barbosa, 1976.↩︎
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Plínio Doyle, História de revistas e jornais literários, vol. 1, Rio de Janeiro, Ministério da Educação e Cultura, Fundação Casa de Rui Barbosa, 1976.↩︎
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Cecilia de Lara, Klaxon & Terra Roxa e outras terras: dois periódicos modernistas de São Paulo, São Paulo, IEB/USP, 1972.↩︎
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Guilherme de Almeida, Folha de São Paulo, 1968. Apud Plínio Doyle, História de revistas e jornais literários, vol. 1, Rio de Janeiro, Ministério da Educação e Cultura, Fundação Casa de Rui Barbosa, 1976.↩︎